Maranhão: superlotação, revolta e barbárie nos presídios
LUIZ FLÁVIO GOMES (@professorLFG)*
Pesquisadora: Mariana Cury Bunduky**
Pesquisadora: Mariana Cury Bunduky**
As conclusões do Instituto de Pesquisa e de
Cultura Luiz Flávio Gomes, com base nos números do DEPEN
– Departamento Penitenciário Nacional, de junho de 2011, indicam que, com
uma taxa de 85,96 presos a cada 100 mil habitantes, o Maranhão é o estado menos
encarcerador do Brasil.
Apesar de tal colocação, os relatos do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), no Mutirão Carcerário realizado entre janeiro de
2010 e janeiro de 2011, apontaram que o cenário carcerário do estado é um dos
mais chocantes e bárbaros do país.
De acordo com o Relatório
do Mutirão,
60% dos 5.473 presos ainda aguardam julgamento (não foram condenados
definitivamente). A falta de colchões atinge quase a metade dos presidiários
maranhenses, obrigando os detentos a dormirem no chão ou revezarem as camas, em
celas com um odor de excremento humano insuportável.
Na Central de Custódia de Presos de Justiça de
Anil, o pior do estado, a superlotação é absurda, sendo que 224 presos são
amontoados em um local com capacidade para 85 detentos e seus corredores ficam
repletos de lixo e restos de comida.
Situações de degradação humana que geram revolta
e muita violência. No Maranhão, existe rixa entre os presos dos estabelecimentos
da cidade e os do interior, resultando num ambiente de horror e barbárie.
A Penitenciária de São Luiz, por exemplo, situou
a maior e mais sangrenta rebelião do estado em 2010, que durou 30 horas, e
causou 18 mortes, três delas por decapitação. Entre abril de 2010 e abril de
2011, ocorreram 43 mortes nos estabelecimentos penais maranhenses, a maioria
deles por homicídio.
Em fevereiro de 2011, seis presos foram mortos na
Delegacia Regional de Pinheiro, sendo que quatro dos mortos tiveram suas cabeças
decepadas e expostas nas grades das celas. E, ainda, um olho humano foi jogado
para fora como forma de pressão na negociação com as autoridades.
Assim sendo, no estado menos encarcerador do
país, existe verdadeira deterioração das vidas dos detentos, regada a sangue e
crueldade.
Comentários do Professor Luiz Flávio Gomes:
A indescritível situação dos presídios
brasileiros, sendo o Maranhão uma amostra, chegou a limites insuportáveis. Claro
que cabe especular a razão de tanta maldade (maldade contra as vítimas e maldade
contra os presos, que são transformados em vítimas do sistema prisional). Talvez
estejamos diante da geração de agentes públicos (policiais, juízes, agentes
penitenciários etc.) mais sanguinária de todos os tempos. Isso não passa de
especulação, mas seria interessante pesquisar mais esse tema.
Os juízes, no que diz respeito aos presos
provisórios, em torno de 44% do sistema, são os diretamente responsáveis por
grande parte do descalabro do sistema prisional brasileiro. É que muitos presos
provisórios não deveriam estar recolhidos nesses degradantes “depósitos” de
seres humanos. No que concerne à vigilância e fiscalização dos infames
presídios, o que se nota é conivência com o Estado de Exceção. Milhares de
presos não possuem condenação definitiva e o Judiciário apresenta uma morosidade
atávica. Nas diligências dos Mutirões Carcerários foram encontradas situações
inusitadas, sobretudo de presos que cumprem penas muito além do tempo fixado na
sentença.
Os presos provisórios, por força das leis, da
Constituição e dos Tratados Internacionais, são (também) destinatários da
presunção de inocência e, mesmo assim, são privados indevidamente da liberdade
(por longo período, em alguns casos). Não se trata de afirmar que, diante da
presunção de inocência, não possa haver prisão cautelar. Porém, essa modalidade
de prisão (que acontece antes da sentença condenatória definitiva), só tem
cabimento quando adequada e absolutamente necessária, precisamente porque a
prisão é exceção, sendo a liberdade a regra.
A enorme quantidade de prisões provisórias
indevidas não conta com nenhuma sustentação em um paradigma de respeito aos
direitos humanos. O estado de barbárie que se instalou no nosso País nessa área
somente pode se alterar com um movimento intenso e resoluto dos juízes, ainda
que com o preço de enfrentar o populismo midiático e político. Mas entre tutelar
os direitos humanos das vítimas (vítimas dos crimes e vítimas do infame sistema
carcerário) e se enfileirar com os diversos populismos (fazendo brilhar, em
consequência, o populismo judicial), mais adequado nos parece cumprir a missão
constitucional de tutela dos direitos e garantias fundamentais.
*LFG – Jurista e cientista criminal. Fundador da
Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz
Flávio Gomes e co-diretor da LivroeNet. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983),
Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Siga-me no
facebook.com/professorLFG, no blogdolfg.com.br, no twitter: @professorLFG e no
YouTube.com/professorLFG.
**Advogada e Pesquisadora do Instituto de
Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes
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